domingo, dezembro 30, 2007

O imaginário, as fantasias que criamos, são parte integrante do chamado aparelho psíquico, daquilo que somos. Ainda que por vezes possam parecer descartáveis, infantis ou bobas, e até incomodem, elas são também inerentes ao que somos e apontam para algo do desejo, da verdade de cada um. Tanto que tendem a ser guardadas com carinho, como aquilo que nos lembra do que realmente deveria ser (e os sonhadores, os artistas são sempre reconhecidos, lembro aqui de John Lennon). Ou também podem se tornar obsessões...
Em "The Perverts Guide To Cinema" Slavoj Zizek fala da fantasia a partir do filme Um Corpo que Cai (Vertigo), citando como a fantasia do personagem de James Stuart de reencontrar a mulher amada, então morta, se transforma em uma obsessão. Em determinado ponto, na tentativa de tornar sua fantasia realidade, ele simplesmente transforma uma Kim Novak na outra (que também era interpretada por Kim, talvez porque no final o objeto sempre seja um só?). Mas a realização da fantasia ganha ares de pesadelo para nós espectadores, como explica Zizek, há sempre algo de estranho, bizarro na realização plena de uma fantasia. Mas naquele momento James Stuart não percebe isso, apenas nós...
Ainda Zizek, em seu texto Lacan as Viewer of Casablanca, fala sobre essa dualidade da fantasia, que nesse texto fica sob o olhar de um Ideal do Eu que precisa esconder o conteúdo sexual ou agressivo, em suma desejante, da fantasia e ainda daquele de um Super Eu que irrompe em angústia para fazer recordar exatamente do que falta nessa fantasia "asséptica" do Ideal do Eu. A fantasia fica então entre o aceitável cheio de angústia pelo que falta e o bizarro da realização plena.
Não é fácil, portanto, ser sujeito desejante. Há que se escolher todo o tempo, sabendo sempre que algo se perde na escolha. Há ainda a saída da sublimação, da arte. Por isso escrever palavras, talvez uma tentiva de exorcizar fantasias desejantes que tentam o ser humano.
Uma última citação: Sombras de Goya (Goya´s Ghosts), novo filme de Milos Forman, fala também de tentação, desejo, loucura, poder, arte e sublimação.

terça-feira, dezembro 25, 2007

Um fim de Natal com boas comédias românticas inglesas...

http://www.youtube.com/watch?v=IyCsYuKnvWk

Com o tempo descobre-se como alguns filmes definiram de alguma forma o que somos e acreditamos. Há que se descobrir isso, para aceitar, mudar.
Mas qual o problema de querer um Hugh Grant declarando amor in the rain? ;-)

Que o Natal tenha sido bom!
"All I want(ed) for Christmas is(was)..."
someone to tell me...
"But I will be very sorry
to drive away from you."

(citação musical e frase do Primeiro Ministro ambas do filme Love Actually/Simplesmente Amor)

domingo, novembro 04, 2007

Ás vezes parece que a vida se escreve como um livro, como numa frase cliché. Momentos em que até parece que tudo vai começar a ter sentido. Talvez não sentido, mas quem sabe, quem sabe tudo pode começar a acontecer. Ou não. Ah, as ilusões que se cria. Para quem no fundo ainda sonha ser uma estrela caída a ser resgatada por um Tristan... Mas anda encontrando mais ironia que fantasia do destino.
Nem parece que a gente cresce.

segunda-feira, agosto 27, 2007

Admirável Mundo Novo
Aldous Huxley


Fiquei fascinada com o livro, pensando nas similaridades de nosso mundo moderno, consumista, de emoções fáceis e superficiais mas ainda salvo pelos livros, pela arte, pela oportunidade de uma individualdiade e de escolhas ainda não condicionadas (ou não?). Pensei no cinema, nos filmes simples quase sensíveis, nos outros filmes mais instigantes ao pensamento que às emoções fáceis. Pensei em Goddard, como seus fimes aos poucos começam a fazer sentido para mim e na sentença emblemática de seu "Nossa Música": matar um homem para defender uma idéia não é defender uma idéia. É matar um homem. E ainda em Bergman, em O Ovo da Serpente. Pensei em outros filmes que talvez transitem num estranho meio termo. Pensei em Hithcock como esse meio termo, que sabidamente manipulava o espectador mas ao mesmo tempo transbordava algo para além da mera manipulação de sustos.

Pensei em Shakespeare, claro. Pensei em poesia.

Pensei na liberdade para escolher, ainda que a solidão e a culpa, como faz o Selvagem John.

Pensei no "bem estar" e na OMS: "saúde é o bem estar bio-psico-social" e me assustei com a semelhança, com a possibilidade de que a saúde seja uma imposição. Não o são as vacinas? Sempre tendo em vista um bem maior, sempre com base no progresso e na ciência. Não é a epidemiologia fruto do progresso? E a clínica, clássica, fruto do contato entre seres humanos, não está perdendo campo, havendo sempre um novo exame, um novo guideline, fluxograma, que bem defina condutas médicas tão bem e claramente que talvez um dia um computador seja médico? Não pode hoje a Psiquiatria, minha especialidade tão cara, melhorar dores e dúvidas antes espirituais, hoje doença chamada "depressão"? Não tendemos a entender alterações de humor com espectros de bipolaridade que podem ser devidamente corrigidos com doses adequadas de Depakene ou algum outro estabilizador do humor? Estabilizamos humores, organizamos pensamentos. Curamos ou aliviamos sofrimentos mentais?
Não duvido do sofrimento humano, talvez inerentemente humano. E tenho dúvidas quanto ao caráter divino e redentor deste sofrimento.
Mas, talvez não duvide da redenção e da divindade quando penso nelas enquanto criações também inerentemente humanas. Quando penso que a liberdade permite que o humano escolha sentir-se digno de ser divino, de se redimir, de escapar aos seus sofrimentos, de alienar-se. Mas por escolha, certa ou errada, e não por imposição de outro humano que "sabe mais". E quem sabe mais de alguém que o próprio? (E quem sabe tanto de si mesmo, sem dúvidas, sem reticências, para arvorar-se a decidir com certeza científica pelos outros o que talvez mal decida para si mesmo?).
"...
E os seus tristes inventores
já são réus - pois se atreveram
a falar em liberdade
Liberdade, essa palavra
que o soho humano alimenta
que não há ninguém que explique
e ninguém que não entenda."
Cecília Meirelles in O Romanceiro da Inconfidência
Poderá haver um futuro em que não se sonhe com a liberdade, pelo simples fato de não mais sonhar? E ao não sonhar, seremos ainda humanos? Teremos realmente nascido? E morreremos realmente? align="justify">
Morrer!
Dormir; dormir
Dormir, sonhar talvez: mas aqui está o ponto de interrogação;
Porque no sono da morte, que sonhos podem assaltar-nos
Uma vez fora da confusão da vida?
William Shakespeare in Hamlet


Pensamentos a posteriori...
Em AI, Spielberg, influenciado por Kubrick e baseado em livro de Brian Aldiss, nos mostra um futuro de robôs que sonham sonhar, para serem então humanos. E nós sonhamos controlar, para sermos robôs?

quinta-feira, julho 05, 2007



Isso (testezinhos) eu fazia no início desse blog, em 2002. Mas estou numa semana muito Lost, só que apaixonada pelo Dr. Jack Shepard e não pro Swayer... ;-)

quinta-feira, junho 21, 2007

Pensamentos e ensaios
Qual é o lugar da clínica, da saúde pública em nosso país?
Qual a importância da saúde? De manter o tal “bem estar bio-psico-social”?
Quando comecei a faculdade de medicina perguntava as pessoas no posto de saúde do Barreto o que elas entendiam como “saúde”. Não me lembro das respostas, mas não eram as da OMS.
Hoje, ainda trabalhando na assistência de saúde pública, especificamente psiquiátrica, vejo as pessoas procurarem um serviço médico, isto é, um centro de atenção “psicosocial” (porque será que tiraram o bio?) por diversas questões psicológicas, psiquiátricas, por sofrimentos diversos que nem patológicos são. Mas quem disse que sofrimento tem que ser patológico? E aí só o patológico é que deve ser tratado? Talvez sim. Mas o que fazer com os outros sofrimentos humanos? Será isso responsabilidade da saúde pública? Se não, de quem? Do indivíduo? Mas e a responsabilidade do governo em oferecer serviços que são pagos pelos impostos?
E o que é feito com os impostos? Saindo da esfera da saúde pública e começando na saúde dentro da Justiça descubro um outro mundo. Sem ostentações, sem excessos, mas com essencial para um bom trabalho. Bons salários, boa infra-estrutura, respeito e reconhecimento do trabalho feito. Não há tudo, não é perfeito. Mas que diferença da falta quase onipresente da saúde. Falta de verbas, de medicamentos, de boas condições de trabalho (salvo as exceções temos serviços com condições no máximo razoáveis de trabalho), de profissionais, por vezes de respeito e de reconhecimento. Reconhecimento este que se faz ver nos salários muito aquém daqueles da justiça (e de outras esferas públicas). E não falo aqui de equiparar a salários do executivo, nem dos altos escalões. Mas posso perguntar porque a base da comparação, que é uma arbitrariedade, uma construção, é o salário mínimo. Mínimo de que? Da cesta básica? Então nosso direito básico é de alimentarmo-nos? Se aceitamos tal base como justa porque será que aceitamos os salários 50 vezes maiores? Nossos deputados, senadores são assim tão melhores que nós? E nossos trabalhadores não o são, não valem isso? Não só na saúde, mas também na educação, não valem salários dignos de serem além do básico melhorado?
De repente me vejo a pensar porque só questiono os salários de funcionários públicos. Estarão estes acima dos outros? Ou talvez o mercado privado tenha outras lógicas de valorização, e muitas vezes também de desvalorização quando não exploração. Sujeitos portanto a fiscalização, denúncias. Mas me parece que no mercado privado fica mais claro, para o bem e para o mal, que cada um defende seus direitos. O problema é que alguns têm mais armas para defesa e ainda para ataque. Mas no serviço público temos a tal máquina pública a qual deveria servir aos cidadãos, os quais constituem o país e o sustentam, já que não estamos aqui por benevolência de algum dono do Brasil que nos permite aqui residir. Frase clichê mas o país é seu povo. Então me pergunto: é o povo que determina que funcionários da saúde devem ganhar pouco? É o povo que determina o salário mínimo (comparado ao qual nem todos da saúde ganham tão pouco)? É o povo, essa entidade onipresente de não sei que presença, que desvaloriza a si e aqueles que dele cuidam? Será então a saúde um valor desvalorizado?
Ou será que máquina pública reflete bem menos do que o esperado os desejos dos indivíduos que a constituem e mantêm?

domingo, junho 10, 2007

Duas pseudo-críticas por serem escritas, desde a primeira do ano que foi devidamente escrita e postada. Meses sem escrever, lendo, vendo, ouvindo. Tantas coisas...
Mas hoje, o recesso de Los Hermanos. Um show belo na sexta-feira. A sensação de tristeza agora que não tem mais show por tempo indeterminado. A escrita ainda aparece no lugar de catarse, de filmes a comentar, de um show, de uma tristeza pelo recesso/pseudo-fim (ou será?) da banda favorita.
Mas eles falam por eles mesmos. E talvez por isso tantos adoradores, por isso 3 dias de Fundição lotada cantando em coro, por isso tanto frisson pelo recesso, jogada de marketing ou não, talvez apenas um tempo de verdade para eles.

"não faz disso esse drama essa dor
é que a sorte é preciso tirar pra ter
perigo é eu me esconder em você
e quando eu vou voltar, quem vai saber"
Primeiro Andar, 4

sexta-feira, janeiro 05, 2007

Primeiro filme do ano: Dias Selvagens, de Wong Kar Wai.
Cineclube Odeon. Pré-estréia do filme que é o "primeiro" da mezzo-trilogia continuada com "Amor á flor da pele" e "2046". O último foi um filme catártico de 2006. "Dias Selvagens" teve menor apelo emocional, mas ainda assim é um belo filme sobre o desejo. Esse que nos domina, por mais que tentemos domá-lo. Esse que retorna do nada (será?) e nos angustia, quando ainda não somos capazes de dar conta dele. De bem aceitá-lo. Mas esse mesmo desejo é só nosso, de mais ninguém. Não vem de um além, mas de dentro de algum lugar que está em nós. Por mais que não saibamos o que fazer com ele, é nosso, e a angústia sobrevem da incapacidade de aceitar o que é nosso.
Por mais que se tente, é impossível negar o desejo, amor, paixão. Tantos nomes para uma só coisa: a necessidade de não se sentir só ao longo do nosso tempo no universo.
E o tempo é um outro fator importante no filme (ainda falava sobre o filme?). Pois o desejo não conhece tempo e pode ser satisfeito (parcialmente) em 1 minuto. Ou pode o amor surgir de um momento, de um gesto, de um olhar.
O que parece permanente é a necessidade. Que sempre levará a a novos desejos, amores paixões. Cabe apenas escolher o objeto amado. Escolher????