segunda-feira, agosto 27, 2007

Admirável Mundo Novo
Aldous Huxley


Fiquei fascinada com o livro, pensando nas similaridades de nosso mundo moderno, consumista, de emoções fáceis e superficiais mas ainda salvo pelos livros, pela arte, pela oportunidade de uma individualdiade e de escolhas ainda não condicionadas (ou não?). Pensei no cinema, nos filmes simples quase sensíveis, nos outros filmes mais instigantes ao pensamento que às emoções fáceis. Pensei em Goddard, como seus fimes aos poucos começam a fazer sentido para mim e na sentença emblemática de seu "Nossa Música": matar um homem para defender uma idéia não é defender uma idéia. É matar um homem. E ainda em Bergman, em O Ovo da Serpente. Pensei em outros filmes que talvez transitem num estranho meio termo. Pensei em Hithcock como esse meio termo, que sabidamente manipulava o espectador mas ao mesmo tempo transbordava algo para além da mera manipulação de sustos.

Pensei em Shakespeare, claro. Pensei em poesia.

Pensei na liberdade para escolher, ainda que a solidão e a culpa, como faz o Selvagem John.

Pensei no "bem estar" e na OMS: "saúde é o bem estar bio-psico-social" e me assustei com a semelhança, com a possibilidade de que a saúde seja uma imposição. Não o são as vacinas? Sempre tendo em vista um bem maior, sempre com base no progresso e na ciência. Não é a epidemiologia fruto do progresso? E a clínica, clássica, fruto do contato entre seres humanos, não está perdendo campo, havendo sempre um novo exame, um novo guideline, fluxograma, que bem defina condutas médicas tão bem e claramente que talvez um dia um computador seja médico? Não pode hoje a Psiquiatria, minha especialidade tão cara, melhorar dores e dúvidas antes espirituais, hoje doença chamada "depressão"? Não tendemos a entender alterações de humor com espectros de bipolaridade que podem ser devidamente corrigidos com doses adequadas de Depakene ou algum outro estabilizador do humor? Estabilizamos humores, organizamos pensamentos. Curamos ou aliviamos sofrimentos mentais?
Não duvido do sofrimento humano, talvez inerentemente humano. E tenho dúvidas quanto ao caráter divino e redentor deste sofrimento.
Mas, talvez não duvide da redenção e da divindade quando penso nelas enquanto criações também inerentemente humanas. Quando penso que a liberdade permite que o humano escolha sentir-se digno de ser divino, de se redimir, de escapar aos seus sofrimentos, de alienar-se. Mas por escolha, certa ou errada, e não por imposição de outro humano que "sabe mais". E quem sabe mais de alguém que o próprio? (E quem sabe tanto de si mesmo, sem dúvidas, sem reticências, para arvorar-se a decidir com certeza científica pelos outros o que talvez mal decida para si mesmo?).
"...
E os seus tristes inventores
já são réus - pois se atreveram
a falar em liberdade
Liberdade, essa palavra
que o soho humano alimenta
que não há ninguém que explique
e ninguém que não entenda."
Cecília Meirelles in O Romanceiro da Inconfidência
Poderá haver um futuro em que não se sonhe com a liberdade, pelo simples fato de não mais sonhar? E ao não sonhar, seremos ainda humanos? Teremos realmente nascido? E morreremos realmente? align="justify">
Morrer!
Dormir; dormir
Dormir, sonhar talvez: mas aqui está o ponto de interrogação;
Porque no sono da morte, que sonhos podem assaltar-nos
Uma vez fora da confusão da vida?
William Shakespeare in Hamlet


Pensamentos a posteriori...
Em AI, Spielberg, influenciado por Kubrick e baseado em livro de Brian Aldiss, nos mostra um futuro de robôs que sonham sonhar, para serem então humanos. E nós sonhamos controlar, para sermos robôs?