domingo, dezembro 31, 2017

Trinta e um de dezembro, que dia melhor para perceber, quase num insight, sozinha em casa, que você é uma pessoa carente? Talvez não pudesse ser melhor mesmo, que o novo ciclo da terra em tono sol permita que eu elabore a carência e me ofereça em relacionamentos por amor, desejo, paixão, falta (aquela que nos é constitutiva, a da castração), mas não pelo sentimento de carência. Se análise é a análise do Complexo de Édipo, cada vez percebo na minha experiência novas nuances desse estádio fundamental da constituição humana para a psicanálise freudolacaniana.
Da experiência traumática (por não ser natural) da castração (de experimentar que há a falta e que ela é constitutiva) via complexo fraterno (um outro, meu irmão, era tão ou mais desejado que eu por meus pais) e assim me perceber, ou experienciar, mais que perceber cognitivamente, não suficiente, experienciar a falta em mim, transformá-la em carência e autossuficiência para não lidar com a falta. A carência por buscar no outro o que me falta de forma puramente imaginária, como se um um qualquer pudesse aplacar a falta. E a autossuficiência por tentar dar conta da falta sozinha, já que os encontros via carência nunca seriam realizados, posto que sempre inflados imaginariamente. Não era um outro, era a imagem fantasística do outro (como na cena de Vertigo, da realização do fantsama, debatida por Zizek). Em uma única palavra: narcisismo.
Um processo de elaboração psicanalítica do narcisismo que foi do enfrentamento de uma neurose que impedia a mera aproximação sexual do outro, ao enfrentamento da castração em ato no campo do trabalho e da família (duas mortes), à possibilidade de encontro com o outro mas de enfrentamento da castração dentro desse encontro que tentei negar por um tempo enorme até aparecer em atuação o fim da relação, até hoje, me percebendo e experienciando como uma neurotiquinha carente e em pequenas (ou nem tanto?) atuações ridículas (mas como fugir de ser ridícula às vezes? Só tentando obsessivamente me controlar, o que parece que eu tenho feito menos, o que já é um caminho). Mas talvez de uma carência que esteja mais próxima da elaboração de algum novo lugar, de sujeito de falta mas também de desejo. Da passagem, no grafo lacaniano, da demanda (a carência) ao desejo.

E como a psicanálise fala de um a posteriori que já estava lá, não à toa me vem a lembrança de uma música boba mas que uma amiga uma vez disse, há 21 anos, me ser adequada:
"Não faz mal, eu tô carente mas eu tô legal" (cantada pela Mara Maravilha, um nome artístico algo autossuficiente).
E de uma passagem de um dos poemas que mais gosto:
"(...) Ele não encontrou
o de que carecia,
o de que carecemos,
eu e meu elefante,
em que amo disfarçar-me.
Exausto de pesquisa,
caiu-lhe o vasto engenho
como simples papel (...)"
O elefante. Carlos Drummond de Andrade.

Que, diferentemente do final do poema, eu não reconstrua minha fantasia de carência, mas possa ultrapassá-la para algo novo no novo ano.

domingo, novembro 26, 2017

Reler o próprio blog e mais uma vez se surpreender com o que já estava lá...

terça-feira, abril 22, 2008

My Blueberry Nights (Um Beijo Roubado)
Wong Kar Wai, 2007

Às vezes é necessário que nos afastemos de nosso lugar de origem para que possamos ter uma outra percepção do que nos rodeia. Às vezes estar num outro lugar que nos é estranho, que não causa a familiaridade da origem permite a emergência de algo novo em nós mesmos. Talvez o já conhecido evoque mais racionalização e crítica (mas não sem sentimento), e quando estamos diante de algo novo apareça mais o afeto puro, ainda sem muita possibilidade de crítica, pois ainda não conhecemos aquilo que nos aparece.
O (primeiro) filme americano de Wong Kar Wai me fez pensar nisso. Talvez por ter me parecido seu filme mais sentimental, de um diretor cujos filmes sempre me pareceram marcados por sentimentos enormes, mas reprimidos, impossíveis. 2046, seu filme anterior, me fez pensar exatamente na (im)possibilidade do amor. Mas este My Blueberry Nights (cujo título brasileiro é simpático á doçura do filme, na verdade os títulos brasileiros dos filmes de Wong Kar Way são sempre bons) fala exatamente da busca de possibilidades. Começa com um fim de relacionamento, que leva ao um encontro. Norah Jones (que funciona como atriz, sua inexperiência parece ser utilizada pelo diretor exatamente para marcar a experiência de uma jovem inocente, no sentido de não prejulgar, criticar, de tomar as experiências como algo novo, como uma primeira vez, inexperiência cinematográfica vira inocência de olhar sobre o mundo) e Jude Law (maravilhoso, sempre, charmoso, sempre) se conhecem em meio a outras histórias de cada um, principalmente a dela. Mas Norah/Elizabeth vai embora, fazendo talvez a escolha menos usual, tal qual escolher a blueberry pie do título. Se aventura sozinha na América, não fugindo de uma nova história de amor (mantém cartões postais que contam sua vida para Jude/Jeremy), mas como se fosse necessário procurar algo de si mesma ao se aventurar, para poder retornar e começar um novo amor. Para que este seja realmente novo. A aventura, o risco, está na viagem, na solidão, na falta de certezas marcadas. Mas o que aparece nessa viagem são os encontros de outras pessoas, de outras possibilidades, espelhos que permitem a Elizabeth se reconhecer e descobrir nas diferenças de reflexo. E ao final, bem, ao final descobrimos nós que Wong Kar Wai também se permitiu uma nova escolha, talvez um momento de se reconhecer no reflexo do espelho americano e fazer um conto mais doce que os seus anteriores. Talvez um olhar inocente sobre uma outra cultura tenha permitido uma expressão mais sentimental que reprimida (ainda que essa repressão fizesse transbordar o sentimento, espelhando, permitindo identificação e encantamento...). Diferente, ainda que sendo a mesma base. Agridoces noites, mais doces... :-)

terça-feira, outubro 10, 2017

"Lembrou-se de uma sensação infantil, de abandono, um medo que devia ter sentido quando bebê."
Quando você descobre que, num texto de puro exercício ficcional, previu seu futuro de 29/12/2016 em 30/11/2008. 
Ou não previ nada, mas simplesmente o medo sempre foi do abandono, só eu não sabia.
Se arriscar ao outro é se arriscar a ser abandonada. 
Fui. 
Talvez ainda seja mais alguma vez.
Mas ainda vale mais a pena o prazer do encontro que a solidão fóbica.

terça-feira, setembro 26, 2017

Música para quando você precisa dizer adeus a algo de si mesma e mudar. Para, quem sabe, ser mais você e menos seus sintomas.





sexta-feira, maio 26, 2017

A música que cita Encontros e Desencontros.


Para que serve um blog em tempo de Facebook, Instagram, Twitter, Tinder? Já me fiz essa pergunta antes e agora tenho alguma resposta: serve para se esconder das pracinhas públicas, mas com alguma chance se de ser achada, lida. Para quando se está cheia de fantasias, um imaginário libidinalmente inflado. O blog como carta anônima (como naquele bobo e adorável filme da adolescência, Admiradora Secreta).